Projeto do deputado Aldo Rebelo recebeu 410 votos favoráveis
O Plenário aprovou, por 410 votos a 63 e 1 abstenção, o texto-base da última versão do deputado Aldo Rebelo (PCdoB-SP) para o projeto de lei do novo Código Florestal, apresentada no último dia 11. Apenas o PSOL e o PV recomendaram voto contrário.
O relatório de Rebelo mantém as exigências de Reserva Legal (porção de mata nativa que varia de 20% a 80% da propriedade) e também as faixas de matas que devem ser preservadas ao longo de cursos d'água - as Áreas de Preservação Permanente (APPs) em beiras de rios.
Isenta, no entanto, pequenas propriedades, de até 4 módulos fiscais (medida que varia de 20 a 400 hectares), a recuperar a Reserva Legal.
Os deputados ainda devem votar em separado uma emenda do PMDB acertada na semana passada entre líderes da base e da oposição, com exceção do PV, do PT e do PSOL.
A emenda contraria a posição defendida pelo Planalto em relação à atualização do código. Dentre outras medidas, retira do Executivo federal a exclusividade de regularizar ocupações em APPs em beiras de rios.
Também amplia os tipos de atividades admitidos nessas regiões e permite ocupações em APPs que tenham ocorrido até julho de 2008.
A partir de agora, os deputados passam a analisar emendas. Um dos pontos polêmicos é a emenda 164, que transfere aos Estados o poder de definir as atividades que poderão ser desenvolvidas em áreas de Proteção Permanente desmatadas.
Antes do início da votação, o deputado Cândido Vaccarezza (PT-SP), líder do governo na Casa, afirmou que o governo é contra a emenda. "O problema não é só conceder aos estados poder para legislar sobre meio ambiente, ela também abre brecha para consolidar todas as áreas desmatadas irregularmente, o que significa anistia para os desmatadores", disse.
Vaccarezza declarou ainda que a presidente Dilma deve tentar alterar o texto no Senado, para então voltar à Câmara. E acrescentou que, caso permaneça a anistia geral das multas para quem desmatou e a consolidação das áreas ocupadas em áreas de preservação permanente, o governo vai vetar.
À tarde, o deputado Moreira Mendes (PPS-RO), presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária, reclamou da pressão feita pelo Executivo na votação do novo código. “Parece até que querem transferir o Plenário da Câmara para o Palácio do Planalto”, protestou.
A sessão para analisar o projeto deverá prosseguir até a madrugada.
Festa e lamentos
As reações à aprovação do projeto de Rebelo iam das celebrações às críticas e previsões pessimistas para o país, dependendo do setor observado.
“Foi uma vitória para os produtores, porque não podíamos abrir mão de ainda mais áreas de produção do que já cedemos”, disse à BBC Brasila senadora Katia Abreu (DEM), que é presidente da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA).
A senadora afirmou ainda que o país não poderia aceitar essa situação diante de seu papel crucial de combater a fome mundial e ressaltou que a população já cedeu o bastante, visto que “o Brasil é o único país do mundo que já abriu mão de áreas férteis para preservar o meio ambiente”.
Por outro lado, ambientalistas lamentaram a aprovação e o fato de o governo ter cedido em muitos dos pontos em debate.
“O que se faz com esse código é contabilizar o prejuízo, em vez de pensar em um plano nacional para as florestas”, afirmou Paulo Adário, coordenador da campanha da Amazônia do Greenpeace.
“Esse projeto nasceu da inspiração de ruralistas. Não estou julgando se esse segmento é bom ou ruim, mas e o projeto de apenas um segmento da sociedade.”
'Ciência ignorada'
Já representantes da academia lamentaram a aprovação de um código que, segudo o pesquisador Antonio Donato Nobre, "foi feito pela primeira vez sem a participação da ciência".
Nobre, agrônomo e pesquisador do Instituto de Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) e do Instituto nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), foi o relator de um estudo feito por diversos especialistas da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) que, segundo ele, foi basicamente ignorado pelos envolvidos na discussão sobre o código.
"Foi apenas uma disputa de lobby. O próprio Aldo admitiu que não tem experiência nessa área", disse Nobre. "É um retrocesso muito grante para muitos setores, especialmente para a agricultura."
O ponto que desobriga produtores de até quatro módulos a reflorestar é um dos que mais trará prejuízos, na opinião do pesquisador. Segundo ele, o módulo fiscal não tem fundação científica e vai criar confusão na hora de interpretar e empregar a lei.
Perigo
O ambientalista do Greenpeace Paulo Adário também criticou a questão polêmica. “Essa anistia de quatro módulos permite um desmatamento brutal", disse.
"E em um país onde o processo democrático é recente, é perigoso criar na sociedade a sensação de que pode anistiar qualquer crime. É como se a Receita Federal dissesse que alguém não precisa pagar IR aquele ano.”
Segundo o ambientalista, só a existência do projeto de Rebelo já aumentou o desmatamento em regiões como o sul da Amazônia e Roraima, por causa da perspectiva de impunidade.
Ele acredita que "perdeu-se a oportunidade de desenvolver um código à altura do potencial de biodiversidade do Brasil, que tem a maior floresta tropical" do mundo.
Já Kátia Abreu, do CNA, disse que se a questão dos quatro módulos e outros pontos do projeto de Rebelo não fossem aprovados se esboçaria um cenário complicado para o país, com o aumento exacerbado dos preços dos alimentos.
Ela afirma que uma área um pouco maior à usada hoje para se produzir grãos e um pouco de cana-de-açúcar teria de ser transformada em regiões preservadas.
“Não faria sentido ceder essas terras para depois termos de comprar comida de países onde não há nem Código Florestal.”
* Com Agência Câmara, Agência Estado, BBC Brasil e Reuters
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