quarta-feira, 23 de maio de 2012

A educação rural está fora de rumo: os agricultores sofrem por falta de conhecimentos e por excesso de individualismo

Polan Lacki

Inicio este texto com as seguintes afirmações, aparentemente muito categóricas, relacionadas com o desenvolvimento agrícola e rural no Brasil e na América Latina: a) a principal causa dos problemas econômicos da grande maioria dos produtores rurais reside nas ineficiências que eles cometem nas distintas etapas do seu negócio agrícola; causadas fundamentalmente pela inadequação do nosso sistema de educação rural, formal nos três níveis e não formal; b) os governos continuam demonstrando que, através da ineficaz via paternalista, definitivamente não estão em condições políticas, operativo-institucionais nem financeiras de solucionar todos os problemas de todos os agricultores, ano após ano. Esta realidade é tão evidente que nos obriga a abandonar as ilusões e utopias da demagogia e do populismo e mudar radicalmente de rumo; c) Necessitamos formar, capacitar e estimular a formação de grupos solidários/cooperativos de agricultores para que eles mesmos saibam e possam evitar, corrigir e/ou eliminar suas ineficiências. Cumprido este pré-requisito educativo-emancipador, os agricultores saberão o que e como fazer para solucionar seus problemas e, ao fazê-lo, simplesmente prescindirão do retórico paternalismo governamental; tal como já estão fazendo muitos agricultores que se emanciparam do paternalismo graças à sua eficiência e espírito cooperativo.

É muito fácil confirmar, diretamente no campo, a ocorrência das ineficiências e a viabilidade de eliminá-las com conhecimentos e com práticas cooperativas.

Para demonstrar que os próprios agricultores poderiam corrigir suas ineficiências, basta visitar as propriedades, comunidades e mercados rurais e nelas, em primeiro lugar, encontrar claros e generalizados erros na maneira como os agricultores produzem, como administram suas propriedades e como comercializam seus excedentes; e, em segundo lugar, constatar que estas ineficiências são causadas muito mais por falta de conhecimentos adequados por parte dos produtores rurais que por falta de ajudas paternalistas dos seus governos (doação de terras, concessão de créditos, subsídios, máquinas, insumos, etc.). As ineficiências que ocorrem com maior frequência na nossa agropecuária e que confirmam o enunciado nos itens a, e c do primeiro parágrafo deste artículo, são as seguintes:

-Os produtores rurais são vítimas do seu próprio individualismo o qual os conduz ao fracasso econômico porque: a) adquirem os insumos sempre em forma individual no varejo, com alto valor agregado e do último elo de uma longa cadeia de intermediação, b) ao comercializar suas colheitas fazem exatamente o contrario; isto é vendem ao primeiro elo desta cadeia, no atacado, sem incorporar-lhes valor agregado e c) muitos insistem em fazer investimentos individuais em maquinaria superdimensionada e de custo elevado (por exemplo semeadoras e colheitadeiras) que utilizam poucos dias ao ano.

-Mesmo que os seus recursos produtivos sejam escassos e não existam severas restrições climáticas, eles mantém a terra, os animais e a mão de obra com baixa produtividade e subutilizados ou improdutivos durante longos períodos do ano.

-Os rendimentos que, em média, os nossos produtores obtêm por unidade de terra e de animal são muito inferiores aos que poderiam atingir aplicando tecnologias de baixo custo; para cuja adoção se requer receber mais conhecimentos da escola que receber mais créditos dos bancos. Analisemos alguns exemplos para confirmá-lo:

a) Semeiam hectares em quantidades superiores à disponibilidade de insumos que seriam necessários para fazê-lo com boa tecnologia, medida que lhes permitiria obter altos rendimentos e reduzir custos por quilo produzido. Na América Latina, de acordo com os dados estatísticos da FAO, os rendimentos médios em quilos por hectare ainda são muito baixos e poderiam ser duplicados, triplicados e em certos casos até quadruplicados, se os produtores estivessem devidamente capacitados para saber fazê-lo. No caso do feijão, uma das culturas mais tradicionais e mais importantes na dieta dos brasileiros e de vários países latino-americanos, estamos colhendo, em média, menos de 900 quilos por hectare. Se dividirmos estes 900.000 gramas pelas 225.000 plantas que normalmente deveríamos semear em um hectare, chegamos à surpreendente conclusão de que cada planta está produzindo apenas 4 gramas de feijão, que correspondem a 10 ou 16 grãos, que, por sua vez, correspondem a duas vagens de feijão por planta. Isto ocorre porque a grande maioria dos produtores de feijão não faz teste de germinação, não regula a semeadora, utiliza sementes geneticamente erodidas e contaminadas com patógenos, não semeia na época correta, na densidade e profundidade adequadas, não faz rotação de culturas e não elimina as ervas daninhas antes que estas causem prejuízo à lavoura. Se adotassem de maneira correta apenas estas medidas, em vez de semear um hectare, provavelmente poderiam semear só um terço de hectare e com a economia obtida ao reduzir a superfície semeada poderiam adquirir sementes melhoradas, fertilizantes e defensivos agrícolas e nesse terço colher os mesmos 900 quilos de feijão.

b) Algo similar ocorre na produção animal. Em média, as novilhas têm seu primeiro parto aos 40 meses de vida, podendo tê-lo inclusive antes dos 25 meses e as vacas adultas têm um bezerro a cada 20 meses podendo tê-lo a cada 12 ou 13 meses. A taxa de desfrute é de 15% podendo ser de 25%. Cada novilho requer um hectare de pastagem para produzir 70 quilos de carne ao ano; cada vaca ocupa em média um hectare de terra para produzir 4 litros de leite ao dia. Frente a este baixíssimo desempenho zootécnico, se o produtor tem mais animais que pastos e rações para alimentá-los adequadamente, seria mais conveniente vender alguns dos seus animais e com o dinheiro obtido melhorar o rendimento e a qualidade das pastagens e dividi-las em piquetes para adotar o pastoreio rotativo, fertilizá-las, produzir suas próprias rações balanceadas, adquirir vacinas, sais minerais e vermífugos. Por falta de capacitação muitos pecuaristas não se dão conta de que, economicamente, é mais conveniente ter uma vaca com boa genética, “desparasitada” e bem alimentada com base em boas pastagens e rações produzidas na propriedade, para que produza 20 litros de leite de boa qualidade por dia, que manter na propriedade 5 vacas famintas, com mastite e cheias de ecto e endoparasitas, que em conjunto produzem os mesmos 20 litros de leite, porém de má qualidade.

-Não diversificam e não escalonam a produção e por esta razão se expõem a riscos desnecessários de clima, doenças/pragas e mercado, que poderiam ser facilmente evitados ou minimizados por eles mesmos. A propósito, como principio básico os agricultores, especialmente os pequenos, deveriam substituir os seus mono ou "bicultivos" de grãos básicos, que lhes proporcionam apenas uma ou duas entradas de dinheiro ao ano, por várias espécies que produzam alimentos para suas famílias e seus animais, além de pequenas receitas durante os 365 dias do ano; com tal diversificação, adicionalmente, se emancipariam da dependência dos créditos e evitariam o endividamento.

-Produzem espécies que ao ser de baixa densidade econômica lhes geram ínfimas receitas por hectare (mandioca, batata, abóbora, batata doce, feijão, milho e outros grãos básicos), em vez de produzir espécies diferenciadas e de maior densidade econômica para vendê-las aos consumidores de poder aquisitivo mais alto. Por exemplo: frutas e hortaliças mais sofisticadas como morangos, abacaxis, atimoias, melões ou figos, cogumelos, aspargos e alcachofras, milho verde, feijão e ervilha para consumir frescas (como vagens verdes), mel de abelha, hortaliças, ovos e frangos produzidos sem agroquímicos, ovos de codorna, leitões com produção programada para épocas de festas, flores e plantas ornamentais, condimentos e plantas medicinais, etc. Devido a que os pequenos agricultores têm pouca superfície de terra, com maior razão deverão substituir/reconverter, de forma gradual e prudente, para não se exporem a riscos desnecessários, os cultivos extensivos, que consomem os pobres, por outros mais intensivos, consumidos pelos ricos. Esta reconversão poderia ser realizada seguindo o principio da “gradualidade”, seja ela horizontal (iniciar com um hectare e nos anos seguintes fazê-lo com mais hectares) ou vertical (iniciar duplicando o rendimento por hectare e no próximo ano triplicá-lo).

-Sofrem significativas perdas, que poderiam ser evitadas, na colheita e posteriores à mesma (físicas ou de qualidade).

-Não adotam medidas elementares de processamento/beneficiamento inicial das colheitas antes de comercializá-las: lavá-las/limpá-las, classificá-las, secá-las, fracioná-las e quando for possível envasá-las; poderiam fazer algo tão simples e elementar como as medidas de “maquiagem” que adotam os supermercados antes de vender as frutas, hortaliças, feijões, raízes e tubérculos, etc.

-E finalmente a ineficiência mais prejudicial aos interesses econômicos dos próprios agricultores.Eles se dedicam apenas à pior etapa do negocio agrícola que é a etapa de produção propriamente dita. Esta é a etapa mais pobre, a que exige mais trabalho e que está mais vulnerável a riscos e incertezas. E, por falta de espírito solidário/associativo com seus vizinhos, "presenteiam" a outros integrantes das cadeias agroalimentares a execução das etapas ricas do negocio agrícola; aquelas que ocorrem antes da produção e as que ocorrem depois de concluída a etapa de produção propriamente dita. Ao dedicar-se apenas à etapa de produção não conseguem se apropriar de um percentual mais elevado e mais justo das riquezas que geram em suas propriedades. E por esta razão os que se apropriam das mesmas são os agiotas que os financiam, os industriais e comerciantes que fabricam e revendem os insumos, os agroindustriais que classificam, processam, fracionam e envasam/empacotam suas produções e as gigantescas redes de supermercados que as comercializam. Em resumo, estas sete ineficiências são as causas mais imediatas da falta de rentabilidade dos agricultores; porque é devido a estes "pecadinhos" aparentemente inofensivos que seus custos por quilo produzido se tornam desnecessariamente altos e os preços de cada quilo que eles vendem se tornam desnecessariamente baixos. A viabilidade e eficácia das medidas corretivas, ”eficientizadoras” e solucionadoras recém propostas estão fundamentadas nos textos incluídos nas seguintes páginas web: www.polanlacki.com.br e www.polanlacki.com.br/agrobr

É melhor viver do agricultor que da agricultura – antigo, porém atualizadíssimo provérbio alemão

O diagnóstico recém descrito nos demonstra claramente que os agricultores continuam cometendo estas ineficiências, não necessariamente por falta de decisões políticas de alto nível, créditos abundantes ou maquinaria. Eles continuam cometendo-as pelas seguintes razões, ambas causadas pela inadequação dos conteúdos educativos e pela baixa qualidade de nossa educação rural: em primeiríssimo lugar, devido à insuficiência, inadequação e obsolescência dos conhecimentos que possuem, em grande parte os que herdaram dos seus pais e/ou avós. Possuindo apenas estes saberes insuficientes e desatualizados, é evidente que eles têm e terão crescentes dificuldades para poder sobreviver economicamente na agricultura; porque com a globalização dos mercados necessitam competir com os agricultores mais eficientes do mundo. Em segundo lugar, devido ao seu ancestral individualismo que não lhes permite solucionar aqueles problemas que exigem maior economia de escala, investimentos de custo mais elevado e serviços que para serem executados requerem que estejam devidamente organizados em grupos solidários ou cooperativos. Estas atitudes individualistas, que deveriam ter sido eliminadas dos comportamentos das crianças nas escolas fundamentais rurais, são as que, em boa medida, lhes impedem de apropriar-se legitimamente de um percentual mais justo das riquezas que produzem em suas propriedades. Vários estudos indicam que, em média, os produtores rurais de América Latina recebem apenas 20% dos preços que os consumidores pagam pelos alimentos nos supermercados, nas feiras de frutas e hortaliças, nas panificadoras e nos açougues. Então, se a origem das sete ineficiências recém analisadas é de caráter educativo e se está instalada nas escolas, querer encontrar soluções fora delas significaria ignorar a mais prioritária necessidade da agricultura e dos agricultores. Por esta razão é necessário e urgente ampliar e adequar os conhecimentos, aptidões e atitudes dos agricultores aos desafios do mundo moderno. Porque seu êxito econômico dependerá cada vez mais do saber e do saber fazer que do possuir recursos materiais e financeiros para fazê-lo; dependerá cada vez mais da capacidade que eles tenham para adotar, de maneira correta, as adequadas decisões técnico-produtivas, gerenciais e comerciais, que das cada vez mais improváveis ajudas paternalistas de seus governos.

O paternalismo está destruindo a dignidade dos pobres rurais

Estes antecedentes nos conduzem ao seguinte caminho da racionalidade e do bom senso, que deveríamos ter seguido há muito tempo, mas infelizmente não o fizemos: substituir o nefasto paternalismo que desestimula as iniciativas e destrói a dignidade das famílias rurais por uma educação que estimule um mais eficiente e solidário protagonismo na solução dos seus próprios problemas. Uma educação que tenha como objetivo desenvolver a criatividade e as potencialidades latentes das famílias rurais e estimular seu autodesenvolvimento, como a mais eficaz estratégia para emancipá-los das decrescentes e excludentes ajudas financeiras e materiais dos seus governos. Entre outras razões, porque dos debilitados, endividados e muitas vezes corrompidos governos é muito pouco ou quase nada o que os agricultores podem esperar. Mesmo que os governos quisessem fazê-lo, definitivamente no disporiam de recursos suficientes para beneficiar a todos os agricultores, através da via paternalista. Por razões de honestidade profissional e de respeito pelos agricultores, não podemos continuar enganando-os com ilusões e utopias. É evidente que os governos necessitam apoiá-los porém deverão fazê-lo através de medidas educativo-emancipadoras e não de pseudo soluções perpetuadoras de dependências do paternalismo.

Se as causas dos problemas estão na escola, as soluções devem ser construídas na escola

Os governos através de suas instituições educativas rurais (que já existem, mas que não estão cumprindo seus objetivos porque funcionam com profundas disfuncionalidades e debilidades) podem e devem formar, capacitar, profissionalizar e "empoderar"/fortalecer intelectualmente os produtores rurais. Tudo isto com o propósito de que eles adquiram a capacidade de aplicar, de maneira correta, medidas/soluções eficazes de produção, de administração rural e de organização comunitária; e que, graças a este "empoderamento", se convertam em eficientes e emancipados solucionadores de seus problemas. A necessidade de profissionalizá-los e organizá-los de forma solidaria é tão evidente que nenhuma proposta séria para promover o desenvolvimento rural poderá continuar ignorando-a e nem sequer subestimando-a. Ao contrario, as quatro instituições educativas analisadas ao final deste artigo, necessitam levá-las à prática com objetividade, determinação e urgência.

Necessitamos teorizar menos e educar mais e melhor

Então, se a estratégia para atingir um desenvolvimento mais autodependente é eminentemente educativa, não há necessidade de continuar teorizando, “filosofando” nem realizando intermináveis elucubrações acadêmicas. Concreta e objetivamente necessitamos proporcionar aos produtores rurais, aos seus empregados e às famílias de ambos, os insumos intelectuais "eficientizadores" e "incrementadores" das suas produções e das suas rendas/receitas familiares. Estes insumos intelectuais, felizmente, já estão disponíveis porém inexplicavelmente “dormem” nos organismos de pesquisa agrícola e nas universidades. As instituições educativas rurais, além de difundir os referidos insumos intelectuais devem levantar o ego, a autoestima e o horizonte de aspirações das famílias rurais, despertando nelas uma ambição sadia e um forte desejo de superação através do seu próprio e eficiente esforço. Tudo isto com o objetivo de demonstrar-lhes que elas mesmas podem encarregar-se da solução de seus principais problemas produtivos, familiares e comunitários. Entretanto, isto exige atualizar e adequar o nosso anacrônico sistema educativo rural, às necessidades de vida e de trabalho imperantes no campo. Estas instituições educativas agrícolas/rurais não podem continuar sendo agrícolas ou rurais apenas no nome; devem sê-lo em seus conteúdos curriculares, em seus métodos pedagógicos e em sua identificação com a cultura agrícola e rural.

As reformas educativas anunciadas com ampla difusão “desaparecem” imediatamente depois dos discursos de lançamento

O grande obstáculo para concretizar esta adequação e atualização educativa reside no fato de que, com raríssimas exceções, o sistema de educação rural e urbano, fortemente influenciado pelos sindicatos de professores, está demonstrando durante décadas e décadas que não está disposto a sair do seu conservadorismo e inércia. Os ruidosos anúncios de reformas educativas ”desaparecem” imediatamente depois de seus discursos de lançamento. Entre outras razões porque se perdem nos labirintos das burocracias ministeriais e não chegam às escolas agrícolas nos três níveis, nem às agencias de extensão rural; e quando chegam não são levadas à prática e ninguém é cobrado nem punido por não terem sido adotadas.

Estas sucessivas décadas de resistências corporativistas e de reformas que não reformam praticamente nada têm sido mais que suficientes para demonstrar-nos que uma reforma educativa séria, rápida e eficaz dificilmente virá das cúpulas e de dentro dos gigantescos e burocratizados ministérios de educação (para o ensino agrícola escolarizado); e tampouco virá dos ministérios de agricultura (para a extensão agrícola). As modificações na educação: a) terão que ser conquistadas através da reivindicação dos agricultores, porque eles são as principais vítimas do atual e pouco útil sistema educativo rural e b) deverão originar-se de baixo para cima e de fora para dentro do sistema oficial de educação. Isto significa que as iniciativas e propostas de reformas deverão partir dos demandantes e não dos ofertantes da educação.

A pressão popular é a única linguagem que os governos entendem

É por todas estas razões que os produtores rurais devem fazer uso da alternativa legítima, e provavelmente a única realmente eficaz, de organizar-se, pressionar e, de forma civilizada porém categórica, exigir que as instituições educativas rurais lhes ofereçam conhecimentos úteis e aplicáveis na solução dos seus problemas. Com tal fim, deverão exigir em caráter de prioridade e urgência as seguintes medidas que assegurem aos habitantes do campo os conhecimentos “eficientizadores”, profissionalizadores e emancipadores, adotando no mínimo as seguintes medidas:

Necessitamos de extensionistas criativos, engenhosos e oxalá "com calos nas mãos e terra nas botinas"

Primeira medida - Nos serviços oficiais de assistência técnica/extensão rural, cujos extensionistas, pelo fato de terem recebido uma inadequada, insuficiente e muito teórica formação nas faculdades de ciências agrárias, deverão receber um curso de recapacitação/atualização para corrigir suas debilidades técnicas e metodológicas. Poderia ser uma capacitação similar à que faziam com alta eficiência e excelentes resultados os antigos serviços de extensão rural, adotando o método de “ensinar e aprender a fazer fazendo”, diretamente no campo. O objetivo da capacitação seria o de conseguir que adquiram uma real capacidade teórico-prática de ensinar aos produtores rurais a superar as ineficiências que são evitáveis, corrigíveis e/ou elimináveis pelos próprios agricultores, por mais adversas e restritivas que sejam as condições físico-produtivas e edafo-climáticas das suas propriedades. Adicionalmente é necessário descentralizar e desburocratizar estes serviços de assistência técnica com o objetivo de que os extensionistas permaneçam (e se for necessário e possível) residam nas comunidades rurais para que possam dedicar todo o seu tempo a capacitar e a organizar os agricultores. Em vez de continuar "burocratizando" nos escritórios, elaborando relatórios com informações irrelevantes e tramitando reiteradas solicitações de créditos, refinanciamentos e perdões de dívidas. Dívidas que muitos agricultores não conseguem pagar aos bancos/agiotas/intermediários, fundamentalmente porque o serviço de extensão rural não lhes proporciona os conhecimentos, muitos deles elementares e primários, para que os agricultores possam gerar renda suficiente para saldar suas dívidas. Entretanto, se por algum motivo os governos não possam ou não desejem adotar estas medidas "eficientizadoras" dos seus próprios serviços de extensão rural, têm a alternativa de delegar, mediante convenio e transferência dos recursos orçamentários correspondentes, a execução das atividades extensionistas a uma ou mais associações de produtores agropecuários reconhecidamente estruturadas, sérias e solventes para que elas as executem seguindo rígidos critérios "meritocráticos" e absolutamente apolíticos.

As faculdades de ciências agrárias necessitam “desurbanizar-se” e enfatizar as práticas no campo

Segunda medida - Nas faculdades de ciências agrárias que deverão "desurbanizar" seu ensino com a finalidade de proporcionar às novas gerações de egressos uma formação muito mais prática e realizada em grande parte onde os problemas ocorrem e necessitam ser resolvidos; isto é, diretamente nas propriedades, comunidades e mercados rurais. Imediatamente depois de graduados deverão estar aptos a formular criativas e engenhosas soluções agronômicas/zootécnicas/veterinárias que lhes permitam corrigir os erros que os produtores rurais cometem. Entretanto, em muitos casos para corrigi-los também é necessário que os profissionais saibam demonstra-lo aos agricultores e pecuaristas, utilizando suas habilidades/destrezas manuais. Por esta razão, alem do domínio dos fundamentos teóricos é necessário que tenham muitos calos em suas mãos. Não consigo entender como um estudante de agronomia de origem urbana formado por professores que em sua maioria também são de origem urbana, possa egressar apto a ensinar aos agricultores como melhorar a produção leiteira se nunca teve a oportunidade e muito menos a obrigatoriedade de preparar uma ração balanceada nem de fazer a ordenha higiênica de uma vaca. Com que autoridade técnica esse profissional recém egresso poderá orientar os agricultores como eles deverão semear, irrigar, colher, enxertar ou podar se nunca regulou uma semeadora, colheitadeira ou equipamento de irrigação, nunca realizou uma enxertia e nunca podou uma árvore frutífera?

As faculdades de educação estão formando educadores muito teóricos que se graduam, mas não sabem educar

Terceira medida - Nas faculdades de educação/pedagogia para que outorguem aos futuros professores das escolas fundamentais uma formação mais útil, instrumental e prática. Com o objetivo de que, a partir do momento da sua graduação (e não muitos anos depois), os professores saibam: o que e como devem fazer para proporcionar às crianças das escolas fundamentais rurais os conhecimentos úteis, as habilidades/aptidões, os princípios, os valores, as atitudes e os comportamentos que as famílias do campo necessitam adquirir.

Os pobres rurais necessitam aprender a erradicar a sua pobreza. Eles não estão interessados em conhecer as biografias dos reis da França

Quarta medida - Nas escolas fundamentais rurais para que "agriculturalizem" e "ruralizem" seus conteúdos curriculares. Para a grande maioria dos habitantes rurais o acesso às escolas fundamentais é a única oportunidade que eles têm para adquirir conhecimentos úteis para a vida e o trabalho no campo. Infelizmente esta excelente oportunidade está sendo desperdiçada porque muitos dos seus conteúdos curriculares são irrelevantes e de pouca utilidade e aplicabilidade na solução dos problemas existentes nas áreas rurais, que eles enfrentarão depois de adultos.

A propósito desta proposta de "agriculturalizar" e "ruralizar" seus programas educativos, sejamos objetivos e realistas: Qual é a utilidade ou aplicabilidade na vida cotidiana das crianças rurais de hoje e agricultores de amanhã, o verniz com adornos pseudoculturais e intelectuais que as referidas escolas apenas fazem memorizar, como, por exemplo: sobre os faraós e as pirâmides de Egito, o Império Romano e Bizantino, as biografias de Robespierre, Richelieu e Montesquieu, idem dos reis de França Luis XIV, Luis XV e Luis XVI ou as guerras napoleônicas, as altitudes do Everest, do Kilimanjaro e das Montanhas Rochosas dos EUA, a extensão do Rio Nilo ou a historia das batalhas que ocorreram no Coliseu de Roma, etc.

Enquanto entediam as crianças com estes conhecimentos irrelevantes para suas necessidades de vida e de trabalho no campo, deixam de ensinar-lhes conteúdos elementares porém muito mais úteis e necessários para a solução dos seus problemas mais imediatos e mais frequentes, como por exemplo: a) Princípios, valores, atitudes e comportamentos para melhorar seu desempenho como pessoas, como pais e mães de família, como empregados ou empreendedores, como membros honestos e solidários/cooperativos de suas comunidades; b) as medidas mais elementares para obter uma produção agropecuária mais eficiente, mais abundante, mais diversificada e mais rentável; c) as medidas de higiene, profilaxia e alimentação que elas deveriam adotar para evitar as doenças que ocorrem com maior frequência nas zonas rurais; d) o que e como deveriam fazer para prevenir as intoxicações com pesticidas e os acidentes rurais; e como aplicar os primeiros auxílios, quando estes acidentes não puderem ser evitados; d) como organizar solidariamente a comunidade para solucionar, em conjunto, aqueles problemas que não podem ou não devem resolver-se individualmente, como por exemplo a aquisição dos insumos e a comercialização das colheitas; e) como evitar as principais pragas e doenças da agricultura e da pecuária; f) como identificar e eliminar as plantas que intoxicam os seus animais e os insetos que transmitem as enfermidades, como identificar cobras venenosas, etc. Em outras palavras, em vez de lhes fazer memorizar a extensão do Rio Nilo, seria mais construtivo ensinar-lhes o que e como deveriam fazer para evitar a poluição do rio de sua própria comunidade. Em vez de fazer-lhes memorizar sobre os Jardins Suspensos da Babilônia, ensinar-lhes o que e como devem fazer para que exista um "Jardim" altamente produtivo em cada propriedade rural, cheio de hortaliças, frutas, cereais, leguminosas, raízes e tubérculos, plantas medicinais, ovos, frangos e coelhos para melhorar a alimentação e consequentemente a saúde familiar.

Quem pode iniciar uma reforma educativa simplificada: apenas o ministro ou também, e principalmente, todos os prefeitos dos municípios rurais?

E para finalizar, uma inovadora estratégia “de baixo para cima” para romper a inércia que está instalada no sistema educativo e para iniciar uma reforma modesta, porém viável, imediata e eficaz, começando pelas escolas fundamentais rurais. As autoridades municipais já têm a competência/atribuição legal para adaptar os conteúdos curriculares das escolas fundamentais, às necessidades próprias de suas áreas de influência. Graças a esta descentralização/desconcentração os agricultores não necessitam esperar semanas ou meses para conseguir uma audiência com as altas autoridades educativas para reivindicar a reforma; tampouco necessitam viajar à capital do seu estado e muito menos à capital do país para apresentar tal reivindicação, ao secretario estadual ou ao ministro de educação. Aproveitando as vantagens da proximidade e da facilidade de contatar diretamente com o prefeito municipal, os agricultores poderão formar uma comissão de líderes rurais e solicitar uma audiência conjunta com o prefeito, com o secretário municipal de educação e com o secretário municipal de agricultura. Concedida a entrevista dizer-lhes clara, objetiva e diretamente o seguinte: Primeiro: a educação que as escolas fundamentais rurais do município estão proporcionando aos nossos filhos é insuficiente e inadequada; nós necessitamos de uma educação com conteúdos curriculares adaptados às necessidades de vida e de trabalho existentes no campo. Segundo: solicitamos que os senhores analisem criticamente os seguintes textos que lhes entregamos neste momento: a) O fracasso de uma educação rural e urbana que oferece o circo antes do pão; b) A educação e o subdesenvolvimento rural: Jardins Suspensos da Babilônia ou hortas familiares? Ensinar o exótico ou o útil e aplicável? e c) Buscando soluções para a crise da agricultura: ¿no guichê do banco ou no banco da escola? Terceiro: dizer-lhes que estes três textos e vários outros artigos que ampliam e fundamentam a necessidade e viabilidade, de iniciar a reforma educativa a partir das escolas fundamentais rurais estão disponíveis, em forma gratuita, no seguinte site: http://www.polanlacki.com.br/br/artigos.html

Depois de analisarem criticamente os três textos provavelmente estas autoridades municipais considerarão a conveniência de organizar uma reunião com os professores das escolas fundamentais rurais e com os membros da comissão de líderes rurais mencionada no parágrafo anterior; com o objetivo de analisar critica e construtivamente o profundo desencontro atualmente existente entre o que as referidas escolas estão ensinando e o que deveriam ensinar aos alunos das comunidades rurais, para prepará-los a que sejam mais eficientes solucionadores dos seus problemas. E, a partir desta constatação, estas autoridades municipais provavelmente tomarão a decisão de iniciar uma reforma, a través de medidas que, graças à sua simplicidade, facilidade de execução e baixo custo, possam ser realizadas imediatamente. Como por exemplo, sob a orientação técnica de um competente engenheiro agrônomo ou técnico agrícola da EMATER ou da secretaria municipal de agricultura, e com a efetiva participação da comunidade rural na sua formulação e execução, implantar uma horta demonstrativa eficiente, diversificada e altamente produtiva, em cada escola rural do município. Entretanto, para que faça jus à denominação de "horta demonstrativa" deverá ser implantada e conduzida com perfeição, eficiência e "capricho"; porque se estes requisitos não forem cumpridos, o efeito demonstração será negativo, em vez de ser positivo e motivador. Esta horta, além de servir como laboratório de aulas práticas para varias disciplinas do currículo da escola teria o objetivo de estimular que o modelo demonstrativo fosse implantado, também com elevada eficiência produtiva, em todas as propriedades rurais da comunidade, do município e; se for bem sucedida, em outros municípios rurais do estado ou do país.

Críticas ao conteúdo deste artigo e solicitações de envios de textos gratuitos sobre extensão rural e educação agrícola formal nos três níveis, serão bem vindas através do email Polan.Lacki@onda.com.br

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